“E
tudo o vento levou” é um filme histórico de 1939, vencedor de 10 Óscares (2
honorários), com cerca de 4 horas de duração. Houve outro filme com grande
impacto que esteve em exibição na segunda semana de maio de 2018 na cidade
invicta, intitulado “E tudo a Queima levou”, com a duração de 168 horas. Ainda
não sabemos quantos óscares vencerá esta película na cerimónia do próximo ano, mas
adivinha-se como forte candidata ao galardão de melhor canção original, melhor
figurino e melhor maquilhagem e penteados. O que também não faltará, com os
inúmeros estudantes a não serem sequer capazes de chegar ao queimódromo, serão quantidades
avultadas de candidatos à melhor curta-metragem.
É
um filme que tem um pouco de tudo: alegria, tristeza, trama, bastante oblívio e
cenas de cariz desapropriado para aqueles que se encontram no lado errado da
maior idade. A queima não terá levado tudo, mas algumas coisas partem irrevogavelmente
com a mítica semana académica. Desde pontos de coeficiente de inteligência e
memórias alheias, ao modelo IS-LM em economia aberta e à teoria populacional
malthusiana, tudo faz parte do olvidamento letárgico que vai na corrente do Etilismo.
A
Queima segue precisamente este propósito. É um casulo de esquecimento, um vácuo
no conhecimento, um evento que, no seu término, faz o indivíduo repensar todas
as escolhas que tomou ao longo da semana. Pelo menos aquelas que recorda. É um
botão de Reset usado para encarar mais
levianamente a época de exames e as idas a recurso ou mesmo, na hipótese mais
extrema, outra queima no currículo.
Muitas
vezes ouvimos o ditado que diz que “o que não nos mata torna-nos mais fortes”. Este
parece-me um princípio algo falacioso, especialmente no que diz respeito à
semana académica. Se algo esteve sequer no limiar de pôr término à nossa vida,
é possível que tenha deixado máculas que nos vão acompanhar durante algum
tempo. Uma queda do quarto andar não deixa nada mais forte, a começar pela
estrutura óssea. De forma diferente, a única coisa que a ida às urgências do Hospital
de Santo António durante o cortejo (uma corrida necessita sempre de uma paragem
pelas boxes) tornará mais forte
será a procura por desintoxicação alcoólica.
No
entanto, nem tudo é negativo nesta ida às boxes.
A utilização do serviço hospitalar requer a manutenção da infraestrutura; as
macas usadas, que alguma empresa teve de fornecer; o respetivo pessoal técnico
do hospital, sejam médicos, enfermeiros, auxiliares que providenciam
assistência e muita paciência; as máquinas da Maselga, que vendem Twixes a pacientes que estão a um Malteser dos diabetes tipo II. Há quem fale num cenário caótico e numa geração perdida. Outros
verão o crescimento e o dinamismo da economia. Esqueçam-se as medidas para
atrair investimento. O que o PIB português realmente necessita é de estudantes
universitários a ingerirem maiores quantidades de Eristoff e Don Simon.
Os
mais acérrimos defensores do equilíbrio de mercado apontarão para a deslocação
para a direita da curva da procura por Guronsan,
provocando um ajuste da oferta, o que, ceteris
paribus acabará por acelerar a atividade económica e maximizar o excedente
total. O problema, no caso do consumidor, é que quando o seu excedente é
maioritariamente constituído por derivados do Etanol, não há economia que lhe
valha.
Diz-se
que nunca se deve regressar aonde já fomos felizes. Talvez seja essa a
explicação para o retorno dos estudantes universitários e dos allumni ao queimódromo, ano após ano: a
queima nunca os deixa plenamente satisfeitos. A procura constante pelo elixir
da vida e pelo alcance do estado de plenitude e êxtase verdadeiros é uma
proposta demasiado tentadora para os estudantes, millenials de gema, abandonarem o barco antecipadamente. Não é o
abandono voluntário da navegação que os faz sair do queimódromo mais cedo, mas
sim a sua viragem espontânea.
Há
outro ditado usado pelos estudantes que reitera que “Finalista pode tudo”.
Embora me confesse favorável a este lema, tenho sérias dúvidas que a semana da
queima seja a preparação ideal para o sucesso do exame de História do Pensamento
Económico. Momentos de otimismo e nostalgia aparte, estou em crer que nem no
curso mais progressista de enologia existe um teste em que a resposta seja “6 shots de Tequilla!!”.
Como
resposta aos tempos modernos, talvez o sucesso académico seja promovido da
melhor forma acrescentando ao programa de HPE, juntamente com Adam Smith ou Karl Marx, as reflexões do ilustre Jack Daniel.
E
assim, no próximo ano, descendo as escadas do Santo António para retornar ao
cortejo, como cidadãos portugueses acabados de usufruir do direito do acesso à
saúde universal, conquistado pelo nosso estado democrático, poderemos voltar todos
a gritar “Mão direita, copo cheio, é penalty”.

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