O uso excessivo da Matemática, a desvalorização do papel da História e a falta de diálogo interdisciplinar têm levado a Economia para uma redoma da qual não demonstra intenção de sair. Note-se o uso da palavra “excessivo” precisamente para notar que, efetivamente, a Matemática pode e é uma ferramenta bastante útil. É uma forma de linguagem. Pode ser mais clara e evidente para quem está a teorizar. Pode também tornar a prova da afirmação mais fácil. Contudo, por muito que custe aos senhores matemáticos adeptos da ciência pura e exata, é bom não esquecer que a Economia é uma ciência social que estuda fenómenos que têm como protagonista um ser completamente imprevisível: o homem. Ora esta rejeição do rótulo de ciência social para a Economia - a quimera da Economia sempre foram os conceitos da Física, exatos por excelência por contrataste com a subjetividade, própria das ciências sociais - está tão enraizada nos estudantes de Economia que estes acabam por demonstrar total desinteresse por assuntos como a história económica, a metodologia da ciência económica e a história do pensamento económico.
O que levará os estudantes e os responsáveis pelos programas de estudos em Economia a atribuírem tão pouca importância a estas matérias? No artigo “No history of ideas, please,We´re Economists”, o economista Mark Blaug apresenta algumas respostas. Refere que nos últimos 30 anos tem sido crescente o número de economistas a lamentar a importância, cada vez menor, atribuída ao estudo do pensamento económico que é muitas vezes tratado como uma espécie de antiquário, sem interesse atual. Contudo, paradoxalmente, o número de conferências e artigos publicados nesta área tem aumentado. Como justificar esta tendência? Em primeiro lugar, devido à mudança metodológica na Economia com uma predominância clara do positivismo. Resulta daqui a ideia de que quanto mais exata é uma ciência, menos necessita da sua história dado que os problemas ou erros que apresentava no passado foram ultrapassados. Como dito por Say “the more perfect the science, the shorter its history” e por Whitehead “science which hesitates to forget its founders is lost”.
Um segundo argumento frequentemente apresentado prende-se com a escassez de recursos, neste caso, o tempo. Como o curso é de apenas três anos e dadas as diferentes áreas que devem ser abordadas é necessário fazer opções o que, por conseguinte, leva à diminuição da carga letiva direcionada a estas matérias. Mas, qual é o critério que leva a que uma licenciatura em Economia apresente três cadeiras em Contabilidade e, em contraposição, apenas uma em História do Pensamento Económico e, espante-se, nenhuma nas áreas da Metodologia Económica (não falando da total ausência de cadeiras nas áreas da Economia comportamental e da Sociologia).
Há uma outra justificação. O estudo da História do Pensamento Económico pode até ser interessante mas não tem relevância prática, isto é, não é produtivo por si. Qual é o empregador que vai valorizar alguém que se apresente como conhecedor de Economia e de Metodologia Económica? Quanto à resposta que o mercado de trabalho dará não me sei pronunciar - até porque acredito que a formação deve ser um fim em si mesmo, e não um meio direcionado única e exclusivamente para lançar os jovens para o mercado de trabalho - mas apresento as palavras de Keynes para responder aqueles que acham que só aquilo que é prático é útil, e que a História para nada serve. Diz Keynes: “The ideas of economists and political philosophers, both when they are right and when they are wrong are more powerful than is commonly understood. Indeed, the world is ruled by little else. Practical men, who believe themselves to be quite exempt from any intellectual influences, are usually slaves of some defunct economist.”
Blaug tenta justificar a sua posição quanto à importância de se estudarem estas matérias e defende que nenhuma teoria, seja ela económica, matemática, da biologia ou da física, pode ser entendida sem conhecimento do seu desenvolvimento e posteriores mutações intelectuais. Refere mesmo que nunca compreenderia a revolução keynesiana sem ter lido Hayek e e Robbins. Robert Skidelsky segue a mesma ideia. Na conferência 'Too much Maths, too litle History', argumentou que seria impossível perceber as ideias de Keynes sem compreender a Grande Depressão, bem como compreender o monetarismo de Milton Friedman sem conhecer a experiência dramática da inflação que abalou os Estados Unidos.
Na mesma conferência, coincidência ou não, chegada a oportunidade do público falar, um jovem estudante de Economia contou a sua própria experiência: demasiada Matemática e pouca ou nenhuma História. E é esta a realidade no ensino da ciência económica - ou será antes um curso de Gestão com rótulo diferente? Passamos três anos a estudar modelos abstratos que não sabemos bem como surgiram, problemas de otimização que realizamos porque temos teste na sexta-feira - mas que nunca questionamos bem os porquês daquilo que estamos a fazer -, e, essencialmente, teorias e modelos completamente descontextualizados do seu contexto histórico.
Todos demonstrámos apreensão para com os pressupostos irrealistas que os modelos apresentam (o agente representativo, a maximização da utilidade, a racionalidade, entre outros) mas, ao mesmo tempo que vemos com desconfiança estas assunções, somos tomados por uma certa apatia e resignação, achando que esta é a melhor e única maneira de estudar Economia. E esta é talvez a minha última crítica. O ensino em Economia é completamente concentrado na teoria neoclássica e rejeita qualquer forma de pluralismo teórico. Saímos da faculdade a achar que há apenas uma forma de pensar e desconhecemos totalmente o que dizem as outras escolas do pensamento sobre as formas de teorizar a Economia.
Termino com uma passagem que ilustra a importância do estudo da história da ciência que estudámos e pretendemos desenvolver para que todos possamos viver melhor. “Economic knowledge is path-dependent. What we now know about the economic system is not something we have just discovered, but it is the sum of all discoveries, insights and false starts in the past. Without Hayek and Robbins and Pigou, no Keynes; without Keynes, no Friedman; without Friedman, no Lucas; without Lucas, no ...” Que subscrevo inteiramente!
André Quintas
Marta Carvalho (Ilustração)

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