Com a saída do
Reino Unido da UE, muitas foram as organizações que se viram obrigadas a
relocalizar a sua sede. Desde o Barclays
Bank até à Diageo – peso-pesado
no mercado de produção de vodka – passando
ainda pelo Goldman Sachs – que
relocalizou a sua sede de operações europeias para Frankfurt - os exemplos são
incontáveis. Os destinos mais escolhidos foram a Irlanda – reconhecida
internacionalmente, desde 2013, com o escândalo da Apple, pelos seus
“incomparáveis” benefícios fiscais – e também Bruxelas – o “coração” da Europa
moderna.
No meio de todo
este vórtice de mudança lá surgiu uma luz de esperança – Portugal teria a
oportunidade de acolher uma das muitas organizações europeias – a Agência
Europeia do Medicamento. Fundada a 1 de janeiro de 1995, a EMA tem como
responsabilidade a avaliação científica e supervisão relativa a todo e qualquer
medicamento ou substância desenvolvida pelos laboratórios para uso ou consumo
em espaço europeu. A EMA ramifica-se em autoridades locais que representam cada
um dos 27 países que atualmente fazem parte da UE– sendo que, em Portugal, esse
representante é o Infarmed.
Receber a Agência
Europeia do Medicamento afigurava-se, à partida, uma missão impossível na qual,
verdade seja dita, apenas os mais líricos poderiam sequer acreditar. Posto
isto, a situação viria a tornar-se ainda mais frágil com toda a polémica que envolveu
a escolha da cidade candidata a receber a agência, polémica essa que colocou os
portugueses numa troca de galhardetes de proporções que já não se vislumbravam
há décadas e teve o condão de ser a chama que reacendeu o antigo, e, pelos
vistos, eterno, confronto entre Norte e Sul.
Inicialmente era
Lisboa, que já é sede de duas agências europeias – a da Segurança Marítima e a
do Observatório da Droga e da Toxicodependência – a escolhida para levar avante
as intenções do governo liderado por António Costa. O favorecimento da capital
foi evidente, pelo que os protestos de muitos dos líderes políticos da zona
foram mais que compreensíveis. Depois de muitos diálogos, contradições e “diz
que disse”, a verdade é que a Invicta foi eleita para integrar a candidatura.
Independentemente da localização escolhida, a instalação da EMA teria um grande
efeito na economia nacional. Um relatório da Deloitte estimava que até 2030 seriam
criados mais de 5.300 empregos, com um impacto direto avaliado na ordem dos 1.130
milhões de euros, permitindo “assegurar um conjunto de benefícios duradouro,
contribuindo para o crescimento da economia portuguesa". Só por aqui
podemos perceber o quão real é o provérbio popular “há males que vêm por bem” –
Portugal sairia sobremaneira beneficiado com o Brexit.
Após ter anunciado
a candidatura, em finais de julho, o governo iniciou aquilo a que chamou uma
“campanha fortíssima” para reunir os apoios imprescindíveis à vitória.
Jornalistas britânicos visitaram o Porto – houve artigos para o The Times e Financial Times – e desenvolveu-se também uma afincada componente
digital que deu pelo nome de “Can´t Skip Facts”. No entanto, e como “quem tudo
quer nada tem”, todos estes esforços se revelaram infrutíferos, tendo Amsterdão
sido escolhida como a próxima “casa” da EMA. O Porto, por sua vez, alcançou um
“honroso” sétimo lugar nas preferências dos ministros da União Europeia –
“honroso” foi como os membros do governo qualificaram esta desilusão autêntica
que, no final de contas, apenas serviu para extremar diferenças entre nortenhos
e sulistas.
Feitas as contas,
muitos dos comentadores políticos que povoam os espaços de opinião consideraram
que a mudança de cidade terá sido um cabal “tiro no pé” nas ambições da
candidatura. Seriam as condições oferecidas pela Invicta, quer em termos de
instalações, quer em termos de acessibilidade, assim tão precárias quando
comparadas com aquelas que poderiam ser proporcionadas pela capital? Será o
Porto assim tão desprovido de serviços quando comparado com Lisboa? Cabe ao
leitor refletir e decidir a resposta a estas duas questões. Mas, ao fazer esse exercício
de consciência, tenha presente um outro juízo que, a meu ver, se afigura também
como bastante pertinente. Atendendo às quase ínfimas probabilidades de Portugal
ganhar a candidatura – independentemente da cidade escolhida – não terá sido
esta uma manobra de propaganda de uma “geringonça” que à altura estava numa
posição bastante periclitante (com os incêndios de Pedrogão e o assalto a
Tancos) e necessitava de algo para galvanizar os portugueses e, de alguma
forma, os distrair da sua própria incompetência?
Pense-se e
reflita-se.
Gonçalo de Sousa Tavares Pé d´Arca

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