Numa altura em que as eleições autárquicas já se
encontram distantes na memória, parece-me adequado fazer uma abordagem
concertada ao panorama atual da política portuguesa, estabelecer as mais
variadas conjeturas para o futuro e refletir em quem foram os grandes
vencedores e derrotados do processo democrático que concretizámos recentemente.
A palavra eleições já tinha sido usada no início da frase, pelo que seria algo
desadequado repeti-la, para além de que dá outra desenvoltura substituí-la por
aquelas cinco palavras.
A adequação que mencionei esvai-se da minha opinião
quando percebo que sou eu o escritor deste texto. Não me parece que haja algo
de relevo que possa trazer no que diz respeito a algum assunto fulcral nas
nossas vidas, e é assim que este se apresenta. Para mim, esquerda e direita são
pouco mais do que equivalentes rodoviários a cederem-me a passagem e a cometer
uma contraordenação grave. Respetivamente. Quando há umas semanas fui votar, entreguei
apenas o papel azul na mesa de voto, ficando com o verde e o amarelo. Já que
até nas eleições temos esta lógica de desperdício, fazendo boletins de voto em
triplicado, decidi usar as réplicas como souvenir.
Claramente, ninguém teve Economia do Ambiente na comissão nacional de eleições.
E ainda há aqueles que se opõem, de forma simultânea, à abstenção e à plantação
do eucalipto. Mas este é cerne da questão: se todos os portugueses tivessem comparecido
nas urnas no dia 1 de outubro, sem os eucaliptos, aonde é que se ia arranjar
tanto papel? Como veem, a minha limitação intelectual obriga-me a remeter o
resto do texto para um assunto mais mundano mas ainda assim relacionado, como é
o início da nossa história nacional.
Sempre tive uma relação especial com a monarquia
portuguesa. Não por alguma afiliação política ao partido popular monárquico,
mas pelo facto de, ao longo da minha infância, ter no quarto um poster com todos os reis de Portugal. São
decorrências de ter uma professora de história como progenitora. No natal, enquanto
os meus amigos andavam a receber o pokémon
amarelo para o game boy, eu tinha de
me contentar com recortes da quarta dinastia e livros de ilustrações que a
minha mãe me fazia pintar em estilo manuelino.
Sempre admirei D. Afonso Henriques, o conquistador. O
grande pai da Lusitânia, fundador daquilo que hoje chamamos de Portugal. O seu
filho D. Sancho I, o povoador, também merece o louvor de pôr os nossos a
habitar as terras conquistadas pelo seu pai. Tudo estava encaminhado para a
construção de uma nação gloriosa, e é então que surge D. Afonso II, o gordo.
Repito, O Gordo. Para o cognome de um rei ser “O gordo” significa que, apesar
das suas funções e de todos os meios à sua disposição para realizar feitos históricos,
a sua principal ação foi ser gordo. Este senhor resolveu fazer jus aos seus
antecessores ficando no castelo a comer pernil de porco com queijo da serra.
Esta era a consequência de não haver nenhuma comissão de inquérito na época,
pois duvido que D. Afonso II conseguisse resistir à impetuosidade de Mariana
Mortágua ao constatar que “o Dono disto tudo apareceu-nos aqui hoje como o
Gordo disto tudo” ou à preocupação de Duarte Marques com a hipertensão do
monarca “o seu pernil estava demasiado Salgado”.
Recorrendo a registos históricos, podemos
reconstruir alguns diálogos dessa época:
- Majestade, Leão e Castela
fizeram um ultimato, a invasão pode estar para breve!
- Pa, deixem-me acabar este pão
com chouriço, a gente já vê isso.
- Mas senhor, a posição dos
mouros está fragilizada, devemos avançar as tropas para sul?
- Mouros? Eu não me meto com
esses senhores, não consigo fazer jejum de uma hora, o que fará o mês inteiro
do ramadão. Deixem para os meus sucessores. Eles vão expandir o nosso
território e levar-nos a grandes épocas de glória nos próximos séculos,
conseguindo construir e manter o nosso pequeno país aqui no canto deste
continente.
- Mas alteza, como sabe tudo isso?
- Porque este diálogo faz parte
de um texto da 28ª edição do jornal Fepiano no ano de 2017 e foi isto que o autor
me pôs a dizer, como é que havia de saber? Tragam-me mas é uma francesinha e um
fino, que o chouriço no meu estômago já está a bater em retirada.
Jorge Gonçalves

Comentários
Enviar um comentário