Embora muitas vezes desconhecida e menosprezada, a
contribuição da Filosofia foi essencial para o surgimento e o desenvolvimento
do pensamento e da ciência económica. A relação entre a Filosofia e a Economia
tem uma natureza verdadeiramente umbilical, podendo a sua origem ser traçada até
ao “pai” da Economia: Adam Smith.
Adam Smith, considerado um dos primeiros economistas
modernos foi um filósofo moral que viveu na Escócia no século XVIII, época do
Iluminismo e da 1ª Revolução Industrial. Autor da “Riqueza das Nações” e da não
tão famosa “Teoria dos Sentimentos Morais”, Smith inspirou gerações de
economistas, pensadores e políticos, criando as bases do chamado pensamento
liberal clássico.
Para percebermos a obra e as ideias de Adam Smith,
incluindo a sua analogia da “mão invisível”, é preciso compreender as
influências da escola filosófica do Estoicismo, em particular de Marco Aurélio,
na sua educação.
O Estoicismo, que deve o seu nome à “Stoa Poikile”, ou
pórtico pintado, localizado em Atenas, onde o seu fundador Zeno de Cítio
ensinava, foi uma das principais correntes filosóficas do mundo greco-romano. Entre
os estóicos podemos destacar o imperador romano Marco Aurélio, quem mais perto
se aproximou do ideal do rei-filósofo de Platão e que Adam Smith refere na sua
obra “Teoria dos Sentimentos Morais”.
Para os estóicos a virtude conduz à felicidade, sendo
que para estes o “Bem”, a “Virtude” e a “Felicidade” são a mesma coisa. Estes
consideram que existem quatro Virtudes Cardinais: a Sabedoria, a Temperança, a
Justiça e a Coragem, que devem ser praticadas e encorajadas através do treino
quotidiano, um exercício intelectual para “acalmar a tempestade da alma”. Este
treino quotidiano não significa necessariamente uma prática austera, mas sim um
exercício com o objetivo de levar a uma “nova vida”, na qual deixaria de estar
sujeito às variações de humor e a atitudes irracionais e desenfreadas.
Mas então qual é a relação entre Marco Aurélio e os
restantes estóicos e Adam Smith e, consequentemente, todo o pensamento
económico moderno? Podemos sintetizá-la pela existência de uma consciência interior,
pela importância do autocontrolo e pela necessidade de cooperarmos uns com os
outros no sentido de melhorar a humanidade.
Assim, a liberdade dos mercados é possível apenas
quando as pessoas interessadas nas trocas demonstram respeito pelos interesses
dos outros, permitindo que ambas as partes beneficiem da troca e daí retirem
maior bem-estar. Dessa forma, Smith e Marco Aurélio convergem na ideia de que a
livre interação entre as pessoas levará a uma melhoria das suas condições de
vida, como que por força de uma “mão invisível”, como dizia Smith n’ “A Riqueza
das Nações”, ocorrendo dessa forma uma cooperação conscienciosa entre os
indivíduos, como Marco Aurélio referia nas suas “Meditações”.
Desta implausível relação entre grandes pensadores e
entre diferentes ramos do pensamento humano é possível concluir que, por um
lado, não podemos esquecer os contributos de muitos homens e mulheres ao longo
dos séculos para as diferentes ciências e ramos do conhecimento humano, sem as
quais não existiria a riqueza da sociedade e do pensamento moderno, e que, por
outro lado, não é possível dissociar a ética da economia e, consequentemente,
do seu estudo e do seu ensino. A Ética e a Economia não são contrárias nem
contrastantes. Elas devem e podem ser complementares e a contribuição de
economistas e de decisores políticos deve ser neste mesmo sentido.
Concluindo, podemos afirmar, face à abundância de
escândalos e crises económico-políticas, que falta aquilo a que Marco Aurélio
chamava a “fortaleza da alma”, a qual uma vez atingida permite fazer a
separação entre “o que está em nosso poder” e o “que não depende de nós”,
tornando-se possível escapar à instabilidade dos acontecimentos e das emoções.
Desse modo, numa sociedade que enfrenta cada vez mais
desafios, económicos, políticos, sociais, tecnológicos e morais, é cada vez
mais necessário o estabelecimento de uma maior transparência e de critérios
éticos que devem reger a atividade de cada um de nós, em especial daqueles com
cargos de maior importância e responsabilidade, quer seja no setor público como
no setor privado. Para esta mudança na sociedade é essencial a intervenção do
sistema de ensino, em particular das universidades, que devem incutir um maior
sentido de cidadania e de respeito.
Portanto, todos aqueles que decidam entrar na
atividade política e que procurem ocupar cargos de serviço público ou de maior
responsabilidade social devem ter como exemplo um Marco Aurélio que “ao mesmo
tempo que cumpria as suas funções de estado, não se deixava dispersar, perder
ou transformar pelo exercício do poder”.
Nuno Sousa
Referências bibliográficas:
Séneca e os
Estóicos- Coleção Grandes Filósofos
“Meditações” -
Marco Aurélio
“How Marcus
Aurelius Influenced Adam Smith (No, Really)”- Paul Meany

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